Per obedientiam ad libertatem
A humildade, talvez a mais trucidada de todas, é vítima de uma barbárie que a transforma no seu contrário. Passou a ser compreendida como uma atitude tolerante, ou seja, como uma recusa definitiva da mais simples honestidade intelectual ou do respeito mínimo pelo conjunto de crenças em que tantas vezes fingimos enquadrar a nossa vida - e, consequentemente, por nós próprios -, em nome de um nivelamento subjectivista de tudo. É por isso que o diabo tem encontrado morada privilegiada neste cancro jacobino, que tem como única virtude, digamos assim, beber da contradição da tolerância de só se tolerar a si mesma como valor e fim absolutos.
Não é pois difícil de adivinhar o fanatismo humilde em que o modernismo mergulhou. Na Igreja, o espírito conciliarista de revolução litúrgica, o ecumenismo, o diálogo inter-religioso e a indiferença perante o falso, são o pináculo desta realidade. Sob uma capa de humildade, a tolerância iluminista - substituta da virtude cristã da paciência e a tal que só tolera o tolerante - cavalga na cartilha dos valores pós-VII para a primeira posição das mais elaboradas formas de dissimulação. O inimigo encontra nela bom terreno para espalhar o desprezo à própria Igreja e a toda a tradição católica, num movimento luterano de reforma intra murus.
O demónio esconde-se pois tão bem sob o véu da humildade quanto lhe é impossível fazê-lo sob o da obediência. E é precisamente por isso que, contrariamente ao que se pensa, um católico tradicional consegue amar tanto um modernista tresmalhado quanto este o odeia.