O comunicado da Congregação para a Doutrina da Fé sobre o último encontro com Mons. Fellay é algo perturbador. Se, por um lado, revela que foi entregue à FSSPX um documento propondo a criação de uma prelatura pessoal (no caso de um "eventual reconhecimento canônico da Fraternidade São Pio X"), por outro, dá a entender a manutenção da discussão no campo das "dificuldades doutrinais que apresentam o Concílio Vaticano II e o Novus Ordo Missae". A este propósito refere que, existindo a necessidade de "esclarecimentos suplementares", essa discussão prolongar-se-a por "uma nova fase".
Ora, isto é perturbador precisamente porque a abertura de uma "nova fase" significaria que a discussão não teria conseguido ultrapassar a questão doutrinal numa matéria que é mais de carácter formal (ou disciplinar) do que de outra coisa qualquer. A catolicidade da FSSPX mede-se pela sua adesão às verdades fundamentais da Fé e não a uma qualquer revelação privada datada dos anos 60. Insistir no contrário é arrastar o caso na falácia modernista de que toda a Igreja depende quase exclusivamente de um concílio e do seu "espírito"; por outro lado, abrir uma janela de diálogo com quem o critica só é exequível com base na aceitação dessa posição crítica e de um modus vivendi que, não participando daquele "espírito" conciliarista, é autenticamente católico e deve estar devidamente enquadrado e reconhecido. Mas, pelo comunicado, não parece ser este o sentido das negociações...
O que aconteceria então se todo o processo encalhasse agora na polémica doutrinária? O que sucederia se alguém provocasse esta situação?
No meu entender, temos dois cenários possíveis: ou as conversações se estendem mais do que o suposto, mas culminam na solução prevista, ou a abertura de uma "nova fase" leva ao desastre. E digo desastre porque, neste momento, não solucionar o único problema real da FSSPX (a sua situação canónica irregular, entenda-se) só poderá desembocar no encerramento definitivo da janela de diálogo e, pior, que no já inevitável desmembramento da FSSPX nenhum desses membros esteja com Roma. Pior ainda: com grande parte desses membros numa deriva rumo a um abrigo sedevacantista onde não aporta a barca de Pedro.
Perguntam os leitores desta casa: poderá alguém ter previsto isto? Será que alguém na Cúria Romana (Papa excluído, como é óbvio), calculou este desfecho?
Julgo que a resposta é "veremos". É possível, de facto, que alguém tenha, no mínimo, ponderado a possibilidade de que a abertura deste processo com a FSSPX levaria a uma previsível divisão interna que, provocado depois o fracasso das discussões doutrinais, levasse à destruição da obra de Lefebvre. Ou seja, a armadilha seria, não o acordo em si, mas, morrendo na praia, não existir acordo de espécie alguma. E este, meus amigos, é sim, actualmente, o pior cenário possível.
Rezemos.